Volte 2 casas...

Eu sou um homem racional, por assim dizer.. Ou pelo menos tento ser.. Em geral meus atos são pensados, calculados... Tento ser o mais ético, objetivo e coerente que da pra ser. Quase sempre me sinto na contra-mão e busco repetir pra mim mesmo os meus motivos... Busco entender as minha relações e a maneira que trato meus amigos, colegas de trabalho, familiares e etc costumam ser pensadas e repensadas. 

O mês de outubro foi um mês tenso, complicado.. No trabalho corríamos (corremos ainda na verdade) o risco de fechar portas e todos irem pra rua, em casa problemas familiares graves, minha relação com a minha mãe cada vez mais e mais e mais distante...

Mas ok... A ordem é sublimar, ok??? A minha mãe é o que é, meus problemas familiares estão diretamente ligados a escolhas de pessoas absolutamente lúcidas e no trabalho o lance é esperar pra ver o que vai dar, né???

Todavia ainda que tudo isso estivesse nítido a impressão que eu tinha é que minha patroa ansiosa com toda a situação agia de forma a querer abater mesmo os mais próximos, como se assim dividisse sua angustia.. Meu avô passou mal, baixou hospital e eu longe sem poder fazer nada... Tudo ao mesmo tempo agora... E eu racionalizando tudo isso, levando da melhor maneira possível.

Só que na sexta passada comecei a ouvir um zunido no ouvido.. Sabem o som do silêncio??? Unzinho que vc ouve no seu ouvido quando nenhum barulho concorre??? Poizé, eu tava com uma versão dele alta... No dia seguinte veio uma dorzinha... Liguei pra minha otorrino, combinei que a veria na terça... No domingo doía mais... Liguei de novo e perguntei se ela me daria um atestado na segunda caso amanhecesse pior e ela disse que tudo bem.

Foi depois do almoço que fui escovar meus dentes e percebi que a água do lado esquerdo da minha bosca escorria sem que eu conseguisse controlar... Achei estranho... Qdo olhei no espelho tentei sorrir... Só conseguia mexer um lado da boca... O olho do mesmo lado tb n piscava... Pronto... Fudeu...

Pensamento número 1: To tendo um derrame sozinho em casa... Seis ligações.. Ng atendeu... Botei uma msg meio fatalista no FB e ai várias ligações e retornos e tals (aliás até hj ligações em retorno)... Consegui falar com minha médica que recomendou o hospital público da cidade vizinha que é referencia e então teria neurologista e otorrino de plantão... Logo apareceram duas amigas e uma delas me levou....

Exame pra lá.. Exame pra cá.. E opa.. Chegamos a uma paralisia facial de ordem emocional.... Tah.. Gasta-se uma grana com medicamento, o plano me cobre as fisioterapias... Mas... Como que dorme com isso??? Não estava tudo tão sob controle???? Emocional???? Acho que meu corpo quis me dizer: Da uma segurada, vc é muito engraçadinho, mas tá pegando muito rojão...

Coscidentemente minha mãe me ligou no dia seguinte, teve uma reação escalafobética, ficou muito impressionada e disse que iria me ver no outro dia (qdo iria a minha cidade natal, entre outras coisas, para ir na minha otorrino)... Eu disse ok, mas depois me arrependi, sabe?? Ultimamente sempre que nos encontramos discutimos.. Minha tia ia encontrar com ela naquela noite, pedi para que conversasse com ela e que tirasse a ideia da sua cabeça, era melhor assim.

Chegando lá fui almoçar com meu pai e irmã e quem me liga??? Mainha, pedindo pra me ver... Minha tia dizia que ela estava mortificada.. Talvez no fundo eu quisesse isso mesmo, fiz uma linha dura, mas assumo que é complicado dizer pra uma mãe que o filho teve uma paralisia facial e que ela não pode vê-lo...

Fui ao seu encontro e sabe??? Acho que foi a primeira conversa que eu tive na vida em que minha mãe me deixou completar uma frase... Uma das últimas vezes que discutimos ela dizia que talvez por ser homossexual fosse dramático demais... Acho que a ficha dela caiu.. A dela e talvez a minha tb... Minha ficha cai toda vez que conto pra alguém e as pessoas me olham espantadas e dizem: Você??? Emocional????

Não que eu ache que minha mãe vai se encaixar na minha fantasia da mãe perfeita a partir desse evento, na verdade nem quero isso.. Acho o marido dela elitista, racista, homofóbico, preconceituoso e outros bichos... Mas longe de mim querer que ela saia desse casamento para viver a minha sombra... Não quero que minha mãe seja um senhorinha de avental fazendo bolos... Ela não é essa pessoa.. Não julgo a vida que leva, acho ótimo que aos 57 anos possa ter a oportunidade de viver como quer.. Quando tá a fim vai pra montanha, qdo resolve vem pra praia e achou um cara que embarque nessa onda toda.. Um escroto, pra mim, mas ele não é casado comigo e sim com ela.... Não tem que me agradar mesmo...

Na conversa, ela chegou a me perguntar se ela achava que deveria sacrificar seu casamento em prol da família.. Não se trata disso, ela precisa apenas ser mais acessível e presente.. Nada além... E ai devo dizer que se esse homem não pode compreender os problemas familiares que ela tem ele de fato não é uma alternativa pra ela. Ele não precisa ir morar na casa dos meus avós, eles só não podem ficar dois meses num lugar que não tem telefone com uma bomba relógio em casa.

Pela primeira vez eu percebi minha mãe de fato ouvindo e vendo que estava errada de alguma forma... Assumindo que inclusive se sente mal com essa postura dela mesma... Repito que não acho que ela vai virar a Dona Florinda em função disso (e nem quero)... mas talvez a situação a tenha feito repensar algumas coisas.

O principal motivo deu ir na minha cidade foi em função de um processo movido contra meu próprio tio, que prefiro chamar de inominável... Tenho pavor de até citar o nome dele... O inominável é uma fonte de problema secular na nossa família e no ano passado após um turbilhão desses problemas conseguímos uma medida protetiva em que ele não podia chegar perto da nossa casa em pelo menos 100 metros.. Só que os ventos mudaram, ele voltou e  a minha avó, após todo um trabalho foi pra frente do juiz dizer que pediu pra ele voltar e o queria de volta.. Absolutamente lúcida, dizendo que vive com ele em paz... Apesar de todos os apelos meus e da minha prima o juiz conclui dizendo que não pode proteger alguém que faz a opção de não ser protegido... Percebendo o quão desapontada minha prima ficou, nos disse que era preciso compreender que alguns problemas na vida cabem a justiça, outros a psicologia e alguns outros são indissolúveis. Fica a lição, que no fundo talvez eu já tivesse entendido perfeitamente racionalmente, mas ter essa compreensão dentro de mim tenha deixado alguma coisa torta lá que resolveu se externalizar. Fechar os olhos e deixar quem se ama definhar não é realmente uma tarefa fácil... Mas é o que tem pra hoje!!!

Minha mãe me fez várias propostas e de me comprar ela sempre foi boa mesmo... Acho que o melhor que faço é aceitar suas ofertas, talvez seja a forma pela qual ela consiga dizer "eu me importo" e me traria mais  qualidade de vida mesmo... É melhorar onde dá pra melhorar e deixar que o tempo e a vida façam o que tenha de fazer com os nós indissolúveis que as vezes eles mesmo dão.