26.6.14

Maluca?



No dia internacional da mulher deste ano listei no FB  uma série de itens felicitando as minhas amigas que não se encaixam neles, considerando que o contrário disso prestava verdadeiros desserviços para suas semelhantes. Dentre os requisitos listados estava: Não compra pra si o papel da maluca quando só cobra coerência. Pq, sim... É uma febre!!!

Certa vez um amigo me dizia  a figura mais execrada pelo homem deixou de ser a piranha para virar a "doida", sinal de que o machismo está se sofisticando. Outrora ele só tinha como alvo mulheres que  exerciam sem maiores problemas sua sexualidade, agora é para qq uma que faça solicitações que em sua avaliação são descabidas. Se olhar direitinho vai ver que há muito mais opções de minar a subjetividade feminina aqui.

Do dia pra noite parece que todas as mulheres do universo, ou a grande maioria, viraram namoradas sinistras, carentes, megalomaníacas e cobrando absurdos desses homens que precisam ser conquistados. Há um sem número de preocupações que a mulher deve ter pra não assustar um pretendente, em geral ligados a deixar claro seu desejo de ter compromisso... Tem que querer, sem parecer muito! Jamais ser carinhosa em demasia, fazer planos um pouco mais a frente, demostrar fragilidades. Me pergunto como se constroi uma relação real de companheirismo e cumplicidade onde não se pode demostrar fragilidades.  

Tudo bem, eu posso assumir que de fato a mulher é criada pra neurose. A elas é delegada a vida inteira o papel de cuidadoras. Na sala de aula não é incomum professoras colocar em meninas próximos de meninos pq eles são mais agitados e elas ajudam a diluir, já as colocando, em alguma proporção, no papel de cuidadoras. No livro "Crianças Francesas Não Fazem Manha" a autora mostra como que na cultura americana, depois de ter filhos, de alguma forma, a sociedade cobra que a mulher esteja descabelada, gorda e rota para que fique claro que deixam de cuidar de si para cuidar de sua prole.Historicamente as fêmeas sempre precisaramm lançar mão de subterfúgios para ter direitos, precisavam comer pela beirada, ir pela tangente, daí essa atmosfera ardilosa, como se fosse uma sucuri, se enrolando pra dar um bote no frágil coelhinho... Uma sucuri doida e desgovernada. Poderia levar horas apontando por A + B que a maneira da mulher se relacionar se faz diferente da do homem, mas que ele também tem complexas especificidades e  afinar esses caminhos é papel de ambos.

Ando acompanhando de perto uma história onde o gajo faz mil declarações para namorada, escreve mensagens públicas apaixonados, publica diariamente foto dos dois, tem tido uma série de comportamento pra lá de namorada sinistra e fica chamando a menina de doida no privado com os mais próximos. Demasiadamente ciumenta, chegada a desagradáveis manifestações públicas de afeto, insegura, são algumas das críticas proferidas pelo boy, mas minha dúvida é: Como posso cobrar qq coisa contrária disso quando sou quem mais nutre toda essa onda?

Outra figura muito comum é aquele cara que vive dizendo que só namora com maluca - acho uma graça dessa gente que tem um problema recorrente na vida e NUNCA olha pro próprio umbigo - Qual é o momento que eu me pergunto até que ponto não sou eu que estou melindroso demais ou que ainda provoco isso nas mulheres com quem me relaciono? Não é possível que em nenhum momento essa criatura não estranhe esse papel que deu pra si de são em meio as loucas. Minimamente deveria pensar sobre suas escolhas e rever afinal de contas quem é o inseguro dessa história.

Alienar alguém para descredenciar seus dramas, suas solicitações e não questionar acerca do funcionamento das coisas é uma estratégia histórica que está ai desde que mundo é mundo e que agora tomou um tom lúdico entre aqueles que brincando, brincando não abrem mão de uma série de privilégios. A piada reforça uma cultura que engrossa um caldo perigoso, através dele também boia uma postura inapetente da segurança pública diante da violência doméstica por exemplo, ou ainda da violência sexual contra mulheres. Lembrei de certa vez que denunciei um louco que parou com o carro na porta da minha casa e espancou a mulher enlouquecidamente, quando a policia chegou eles já tinham ido, ao explicar o que aconteceu me pediram para descrever o casal e com a descrição veio uma reação de "aahh.. a maluca de novo". Ela que já deve ter sido protagonista de diversos episódios anteriores e não conseguiu seguir a diante com suas denúncias era motivo de piada entre os policiais que já banalizaram a violência sofrida pela vítima, um caminho triste e infelizmente rotineiro. 

Quando se vive em sociedade é preciso se pensar que nosso comportamento na esfera privada sempre está construindo ou destruindo algo maior no público e em se tratando deste assunto a posição de avaliador da sanidade alheia tem sido uma posição comoda e covarde que nossos machos tem comprado pra si e infelizmente nossas fêmeas tem assinado em baixo. 

9 comentários:

  1. Nossa perfeito o seu texto.. concordo plenamente!!
    Mas gato vejo isso no meio gay tb.... já fui duramente criticado por mostrar as minhas fragilidades... ai eu fico pensando: Mas quem tem uma vida perfeita? Quem é perfeito?? Será quem alguém se lembra que numa relação são duas pessoas com sentimentos??

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    1. Como muito bem diria Zelia Duncan: "Quem se diz muito perfeito na certa encontrou um jeito insosso pra não ser de carne e osso."

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    2. Vc ultimamente anda tão perfeito, se não fosse casado eu dava em cima...kkkkkkk brincadeira.... Mas morro de curiosidade de saber quem é vc... Sei que temos amigos em comum!!!

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    3. E quem não tem nesse ovo de cidade que é o nosso??? Ainda mais no meio gay, aí vira ovo de codorna!!!

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  2. Texto maravilhoso como sempre. Seus textos sobre comportamento são sempre muito bons! Agora, eu também pensei muito no mundo gay, não vi muita diferença sobre o trecho que sobre as fragilidades, como o Jansen acima notou (vc inclusive já me deu este toque que eu chegava chegando muito rápido, não é?); também tenho vários amigos que reclamam do tipo de namorado que conseguem, mas não modificam seus comportamentos sobre homens, buscando sempre o mesmo padrão e se surpreendendo porque encontram o mesmo tipo de pessoa...
    Sobre a violência pública, ai também se localiza a questão de que a culpa da agressão é da vítima não é? da mulher espancada pelo marido, da mulher estuprada, o lugar dessa mulher também é de culpada já que como a ela cabe a educação de todo o macho que existe, se ela falha no seu papel e se torna vítima, logo, falhou no seu papel de mulher.

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  3. esse aqui é só para notificar as respostas no meu e-mail

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  4. Mulheres... por essas e outras que parei de trabalhar com o produto... ;)

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  5. E eu acho que vcs tem de marcar pra se conhecer, só acho.

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