30.12.22

O Contador de Histórias

 


Eu nem lembro exatamente quando eu conheci ele, mas posso dizer seguramente que fazem muitos anos. Quem me conhece sabe que eu sou bastante safado e a maneira que eu expresso minha sexualidade sempre foi bastante diversa. Nunca curti muito me masturbar vendo fotos, mas vendo vídeos, ouvindo coisas, lendo contos, sempre foram alternativas que ora eu apelo mais pra uma, ora eu apelo mais pra outra. Uma modalidade que eu sempre achei legal é criar fantasias escritas.

Funciona assim: Duas pessoas escrevem juntas um conto erótico, nessa fantasia cada um encarna um personagem e vai interpretando. Fiz muito isso na vida em salas de bate papo da UOL, até hoje vc tem salas destinadas a fantasias e salas criadas por assinantes praticamente fixas com temas como "Fantasias de Marido", "Fantasia HxH", "Fantasias Detalhadas" e etc. Em geral os parceiros de escrita de lá não são bons,  escrevem mal, desenvolvem pouco a história, além do template do chat não ser propício pra isso.

Existem espaços específicos pra roleplay erótico na internet, inclusive foi desses espaços que surgiu o meme eterno do romance de Faustão com Selena Gomez ou de romance entre meninas do Fifith Harmony. Fato é que reza a lenda que esses espaços no Brasil são bem teens, limitando escritores com uma pegada mais madura. 

Se vc nunca soube disso, vc não esteve na internet na última década

Foi frequentando as salas de fantasia da UOL que conheci o boy que vou chamar aqui de Forrest. Ele, na época, tinha vinte e poucos anos e curtia escrever com muita riqueza de detalhes. Pra ele também era fundamental o formato, a pontuação, sem abreviações... Enfim, quase que um conto erótico escrito com as regras da ABNT, um hibrido de fantasia com artigo científico.  Ele também tinha um universo de personagens e situações prontas e gostava de escrever dentro desse universo. A maioria dos personagens (talvez todos) eram baseados em pessoas que ele conhecia, Forrest fazia da fantasia uma extensão dos seus contatos cotidianos, secretava um mundo erótico em que personas do seu convívios inspiravam histórias excitantes. O personagem principal era sempre ele e o seu namorado, um cara muito tóxico (interpretado por mim).

Eu tô falando tudo isso no passado, mas preciso dizer que ele ainda está nas minhas redes de contatos e permanece "viciado" em roleplay. O personagem dele se submete a muitos abusos e ele sempre diz que isso tem a ver com a personalidade dele e com uma espécie de masoquismo psicológico que o leva a viver relações tóxicas na vida real. Em todos esses anos o personagem teve alguns avanços, que ele entende que são seus avanços em anos de terapia.


Durante todo esse tempo me contou muito sobre sua vida. O Boy não podia ser mais diferente de mim, classe média branca, cheio de "White people poblems" me desperta um sentimento muito bizarro. Ele diz que nunca teve um parceiro por tanto tempo e que sente que ninguém escreve como eu. Ele sente mais prazer em roleplay do que em sexo e tá sempre me implorando presença. Eu já estive em diversas fases da vida em termos de tempo e trabalho, o que me permitia escrever mais ou menos, mas fato é que apesar de ser muito prazerosos pra mim tem um outro problema. Certa vez ele recebeu uma crítica que faz muito sentido, um parceiro de conto falou que suas fics era uma parceria 90/10.. 90% de contribuição dele e 10% de quem escreve junto só se encaixando na história em que ele não só define personagens, cenários e situações como tbm dita o tom do personagem que o parceiro interpreta e os encaminhamentos que ele deve ter, há pouquíssima liberdade ele se queixa se você sai muito do roteiro que ele pré programou. Nesse contexto algumas histórias eu gosto mais, outras eu acho um saco. Então por que ficaria horas nisso?

Todavia devo assumir que Forrest dialoga com qq sadismo que habita em mim, assumo que muitas vezes sou grosseiro no trato com ele. fico de saco cheio com a insistência quando acho que não tenho espaço e tempo pra dar a tenção que ele demanda, reclamo das histórias, mas volta e meia tô lá... As vezes fico me perguntando se minha relação com ele não é uma punição inconsciente a bicha branca de classe média padrão com uma cueca da Calvin Klein.. Eu puno ele nos contos, puno ele sendo duro, puno ele vendo ele se rastejar pelas histórias.

Curioso é que a gente não mora na mesma cidade, mas também não é tão longe e ainda somos da mesma cidade natal, já estivemos os dois na mesma cidade, até conhecemos pessoas em comum, mas eu nunca tive nenhum interesse real em conhece-lo (ele já chegou a propor), mesmo por que eu realmente acho que não temos nenhuma afinidade e isso seria mexer em "time que tá ganhando" (tá?) . 

A bem da verdade é que acho que o Forrest fala com uma sombra minha (tal qual o BDSM) aqui essa sombra está agindo de forma consentida, controlada e negociada. Semana passada tivemos um desentendimento, ele ficou super desesperado achando que eu iria bloqueá-lo, embora  eu não tenha essa insegurança com relação a ele, em algum momento tbm tive esse medinho (que naturalmente não deixei transparecer). É uma relação muito maluca que sempre me faz pensar que pareço legal, mas tenho o Forrest na minha vida! 

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