7.1.23

A cultura do Block - Qual o limite?!

 


O ano é 2023, os discursos de ódio ganham lastro com a ascensão das redes sociais. Nunca tivemos tanto acesso as percepções políticos ideológicas do outro. Antes do advento das redes sociais o quanto você saberia sobre os hábitos, opiniões e gostos de pessoas totalmente aleatórias que vc só conhece? De repente você descobre através do storie do whatsapp que o motorista que tá no grupo do ônibus da sua faculdade votou no Bolsonaro, que a vizinha do 402 que você só cumprimenta no elevador tem simpatia por regimes fascistas, que a corretora que alugou a casa pra você é contra o aborto, que a mãe de um coleguinha do seu filho da escola é contra a "ideologia de gênero".

Num período de tanta polarização determinadas bandeiras protestam contra direitos e as vezes contra a existência de alguns seguimentos. Determinadas convivências parecem inconciliáveis e bloquear parece a única alternativa.  O debate contemporâneo sobe bloqueio também não chega a um consenso sobre a construção da tal bolha. Se por um lado defende-se a ideia de que precisamos aprender a conviver e ouvir a diferença por outro entende-se a importância da manutenção de relação entre pares em prol de saúde mental. Não há como viver em constante embate ou recebendo mensagens que te crie desconforto. 

Além disso tem um outro aspecto que precisa entrar pra conta. O que estar sempre bloqueando pessoas causa em você? Como diria Falcão "Também morre quem atira". Se livrar de uma pessoa que promove postagens desagradáveis aqui, outra acolá, vai gerando uma cultura do bloqueio. Em pouco tempo você está bloqueando por todo e quaisquer motivos. Em se tratando do mundo gay o bloqueio também presta um serviço de peneirar quem é interessante pra mim e neste caso não é nada incomum que os critérios de bloqueio flertem com motivações racistas, homofóbicas, misóginas, gordofóbicas, etaristas, capacitistas, psicofóbicas, bairristas, xenofóbicas, classistas e outras opressões disfarçadas de gosto.  A formula é simples: Começo bloqueando o que me faz mal e termino bloqueando tudo aquilo que não quero enxergar por puro hábito, é simples e confortável fazer.  A gente sabe quando a  cultura do bloqueio está sedimentada quando a pessoa começa a postar orgulhosa em redes sociais que bloqueia mesmo, como se a habilidade em afastar pessoas fosse um mérito.

Minha série favorita na vida, Black Mirror, é uma espécie de scifi que mostra histórias diferentes em cada um dos seus episódios, mas sempre tratando da relação do homem com a tecnologia. Na segunda temporada ela apresenta um episódio chamado White Chritmas (Natal Branco) em que existe uma tecnologia que pode bloquear pessoas na vida real. O episódio traz reflexões importantes quando faz pensar o que significaria no presencial um hábito tão perpetuado no virtual. 




Tem uma frase imortalizada por Jean Paul Sartre que diz que "O inferno são os outros". Há quem diga que a frase completa é "Se o inferno são os outros, também esta é a nossa única alternativa". Conviver é ao mesmo tempo um imperativo e um dos exercícios humanos mais difíceis que a gente não tem feito muito bem desde que existimos enquanto espécie.  Eu também já bloqueei pessoas e acho que é necessário fazer eventualmente, só entendo que essa não deve ser a sua primeira  alternativa e muito menos motivo de orgulho. É preciso ser refletido, é preciso se perguntar o quanto você tem utilizado desse recurso, é preciso tentar vincular gestos individuais a propósitos maiores de vida. Pergunte-se sempre a pessoa que você quer ser e como determinadas formas de se relacionar podem te afastar ou te aproximar disso. Busque ser a mudança que quer ser no mundo... E depois disso decida se bloqueia ou não. Vou concluir esse post uma frase do Pantera Negra que casa muito bem para essa reflexão: 

Em tempos de crises os sábios constroem pontes, enquanto os tolos constroem muros. 


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