2.1.23

Sem foto, sem papzzzzz...

 


Essa conversa de "sem foto, sem papo" é daquelas coisas socialmente aceitas que ninguém nem reflete, mas tem camadas e mais camadas de complexidade nisso. O discurso é tão aceito que é perpetuado até por quem não tem foto de rosto em aplicativos de geolocalização e nego não enxerga o tiro no pé que tá dando com isso. Comentei no post que fiz sobre o rando chat, aplicativo que costumo entrar e que é repleto de muito anonimato, que falaria sobre o fato de não pedir foto de ninguém e eis-me aqui.

Sobre o rando especificamente atribuo a falta de fotos a ter muita gente da geração z, que não é pouco comum ter problema com autoimagem e daí não tem foto, ou tem foto com pedaços do corpo, ou tem foto com cara de cachorrinho, com pintas, chifrinho, ou qq outra coisa que ajude a mostrar menos. Eu seria simplista se parasse aqui, tem muito casado no sigilão e tbm muita gente que usa o espaço como escapismo então não coloca sua imagem pra poder ter ali uma espécie de avatar no denso mar da socialização. Acho que é importante a gente entender que existem motivos diferentes pra que as pessoas não tenham fotos e isso também se expressa de forma diferente em espaços diferentes. 

No grinder,  por exemplo, quanto mais no interior você está, mas você encontra pessoas sem foto. Ele é um aplicativo de encontros, por geolocalização, então um espaço em que você lida com a comunidade gay local... Você pode encontrar lá seu vizinho, seu chefe, seu cliente, seu fornecedor, seu professor e por aí vai. Isso  acaba limitando ainda mais as coisas. Aliás devo dizer que eu mesmo tenho um perfil de casal no grinder, mas em função de morar numa cidade pequena do interior somada a minha profissão e todo preconceito em torno de relações não monogâmicas, eu opto por não me expor. Todavia no rando que falo com pessoas do Brasil inteiro, faço sem nenhuma cerimonia. 

Eu acho natural um discurso corrente que antipatize a figura do não assumido, mas a bem da verdade a mesma comunidade que pressiona seus pares por imagem, adora adular homens de 35 anos que procuram encontros no sigilão. Adora adular tudo que faz parecer não ser gay... E a contradição não para por aqui. Apesar de um tom de crítica a falta de ousadia, o que se quer mesmo é fazer uma avaliação para saber se vale a pena não só encontrar, mas manter no seu "cardápio". Enquanto um homem fora do padrão a vida inteira construí minha autoestima enviando fotos e sendo bloqueado. O universo gay nunca somou pra minha autoestima e acho que no fundo não soma com a de ninguém. Isso já rolava na era MSN e na era grinder é muito pior, por que o aplicativo bonifica quem bloqueia. Você tem uma rede limitada de pessoas, então se vc bloqueia esse cara por quem não tem interesse, outro cara aparece como uma possibilidade. No fim a bem da verdade é que a foto na era grinder vem como uma espécie de análise fria, pra avaliar se vale a pena te manter como um contato possível.

Então não me venha sustentar uma narrativa de envio de foto por uma questão de justiça em função deu estar me expondo. Pode haver isso, mas é secundário, em geral a  principal preocupação é atualização do catálogo. A gente precisa parar pra perceber que o "mundinho GLS" não se restringe a pessoas gays, assumidas, profissionais liberais, de classe média, nos grandes centros. Mesmo pessoas assumidas podem se sentir expostas em aplicativos de relacionamento por que estar nesse espaço pode ser problemático em algum campo da sua vida. 

A matemática pra mim é muito simples. Eu não deixo de falar com ninguém por aparência, não tô dizendo que sou uma Madre Teresa de Calcutá piranha version que se disponibiliza a ficar com qq um por empatia (embora meu filtro seja bem amplo mesmo), mas o fato deu não ter intenção de ficar com alguém não significa que tenho que fechar um canal de comunicação... Acho absolutamente arrogante a ideia de que alguém é tão feio que não pode nem me dar "Bom dia". Eu entendo que quem não tem foto, tem motivo para não ter foto e em função disso eu não peço foto. Ela pode não querer mandar por sua profissão, por problema de autoimagem, por estar numa relação, por mil motivos que não me cabem. A pessoa manda quando sentir-se a vontade pra tal e segue o baile. Lógico que não ter imagens pode restringir muito as coisas... Eu não vou, por exemplo, encontrar com ninguém com quem eu nunca tenha trocado fotos. Se for em aplicativo de geolocalização, tbm não vou fazer confissões ou partilhar fantasias com quem tá a 155metros e não sei quem é... mas ainda sim a gente pode se falar.  A única coisa que realmente não faço é, nos espaços em que eu tenho foto, mandar mais foto pra quem não tem foto nenhuma. Por que aí é muito desaforo.

Outro anexo importante desse assunto é o nude, que realmente tornou-se o passaporte de qq diálogo que tenha uma intenção de encontro. Eu não gosto de enviar (principalmente em aplicativos de geolocalização) e me sinto totalmente incomodado quando me perguntam "por que". Quer saber os motivos com qual intenção? Vai sentar e refletir comigo por quais motivos eu devo quebrar meus protocolos de autopreservação pra atender a sua curiosidade? Vai para puta que o pariu, né Gente Boa!

Resumindo.. Essa conversa de "pópópó é muito chato conversar com fantasminha" é meu ovo... O que você está fazendo é só perpetuar a aspereza nesse grande destruidor de autoestimas que são esses aplicativos de geolocalização. Flertar entre gays em 2022 é um eterno se perguntar 'Tô confusa, é fã ou é hater?"




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